De
forma decrescente (que se estende aos dias atuais), até a década de 70, a
sociedade brasileira mantinha alguns valores sob os quais a identidade nacional
se configurava. Tínhamos, até aquela época, costumes (mores) rígidos tanto para
a manutenção de fundamentos ético-morais quanto para a hipocrisia e a desigualdade
social.
Em
que pese leis e costumes falseados por uma ideologia dominante, de recorte
autoritário e patrimonialista, estes ainda se estacavam sobre a aparência de
leis justas e costumes sábios e dignos. Nisso a sociedade em geral acreditava,
mormente índices alarmantes de analfabetismo e ignorância da realidade.
A
vitória do capitalismo sobre o socialismo real e a subsequente globalização
decerto tiveram o condão de desestruturar os esquemas prevalecentes e sobre
estes escombros foram reconfigurados os costumes (de forma radical) e as leis
(principalmente sobre comércio internacional e quase nada de cível e penal).
Claro e evidente que as mudanças sociais ocorrem sob o figurino dos interesses
da classe hegemônica. O episódio de (mais uma vez) se jogar fora a criança
junto com a água da bacia se repete na nossa historiografia, uma vez que
ocorreu a troca de valores baseados na honra estamental por outros puramente
econômicos (racional-legal). Da mesma forma, a salutar liberação dos costumes
(da intolerância e preconceitos religiosos, sexuais, de raças, etc.) veio em
dose mastodôntica, criando expectativas e reivindicações histéricas e nos
lançando num cenário em que se anunciar gay, negro, natureba precede as
próprias competências e qualidades. Um cenário pelo avesso que deixou de lado
as sanções sociais e passou a premiar as transgressões, onde um bom escândalo
(de qualquer natureza) faz o famoso ganhar mais dinheiro e mais notoriedade.
Há
que se estabelecer distinções entre a arte e a indústria cultural, pois esta se
estabeleceu como sucedânea da primeira, apenas por força das aparências. No
núcleo basilar desta questão, podemos afirmar que quando se faz algo para a
obtenção do lucro puro e simples, se faz comércio e não arte. Desta forma, a
preocupação social dos artistas não pode ser a mesma dos personagens que se
dedicam à indústria cultural, pois que estes produzem mercadorias impessoais
que, independem de suas qualidades (conteúdo), pois que são vendidas sob
estratégias do mercado.
Uma
obra de arte, o mais das vezes é fruto da criação individual, mas sempre se
reporta e se desdobra em enriquecimento da sociedade, ou seja, a obra artística
tem como fundamento e destino a sociedade e não o próprio artista.
Já
faz tempo que manifestações artísticas se transformaram em reles “mercadorias
da alma e do espírito” e ultimamente estamos assistindo ao coroamento deste
processo de transformação de artistas (pessoas humanas) em mercadorias. Um
exemplo bem explícito e grosseiro é determinado artista se deixar enredar em
promoções nas quais o prêmio é um jantar com ele. Não sei porque diabos alguém
sem encontraria com outrem por força de uma premiação e, neste caso, a pessoa é
coisificada, nada mais sendo que uma mercadoria a ser entregue em cumprimento
de uma obrigação comercial.
Nos
(des)caminhos da fetichização globalizada, mais relevante que a qualidade da
música ou do livro lançados são as informações (fúteis e vazias), veiculadas
como notícias sérias, sobre a vida privada dos seus autores. Aí se dá a consumação
da estratégia de merketing que é esvaziar a coisa a ser vendida (escamoteando
sua má qualidade) e agregar à ela predicados externos e dissociados.