segunda-feira, 25 de abril de 2016

O aparelhamento dos movimentos sociais e dos sindicatos

Afinal, o que é um Movimento Social? É a reunião de cidadãos em torno de determinada demanda coletiva Desta forma toda ação de um movimento social se dá em torno de determinados objetivos que lhe são próprios e os quais defendem. É lícito afirmar que um movimento que luta em prol da Reforma Agrária é genuinamente social, na medida em que tal demanda no Brasil é histórica. Entretanto este mesmo movimento se atrelar a um partido e ao governo deste partido o descaracteriza enquanto Movimento Social, pois que ao partidarizar seus objetivos, deixa de ser uma luta social, com caráter universal e passa a ser “parte” (de partido) da sociedade.
No caso do MST (entre outros), fica patente ser um movimento que atende aos interesses do Partido dos Trabalhadores e não dos militantes em busca de terras. Em seus quadros (principalmente de liderança) estão encasteladas pessoas que não necessitam de terras, muitas das quais, em todas as suas existências, só tiveram o privilégio de pisar no asfalto e em tapetes palacianos. São lideranças profissionais totalmente submetidas ao governo e ao seu partido em troca de verbas federais liberadas por este mesmo governo.
Pela lógica estruturada pelo MST, todos os seus integrantes são necessariamente petistas e apenas o Partido dos Trabalhadores será capaz de efetuar uma Reforma Agrária no país. Evidentemente que esta postura é gritantemente antidemocrática e falaciosa, pois, no estado democrático é lícito que todos os partidos legalmente constituídos almejem o poder através das urnas. Cabe aos movimentos sociais demandar suas necessidades aos governantes que, necessariamente não pertencem ao partido de sua predileção.
A forma como o MST se enquadra na presente realidade, representa uma excrescência e mesmo um desafio às leis constituídas e, de forma velada, tem auferido do governo a garantia impunidade nas suas atuações ilegais. Por seu lado, o governo se desvia de suas obrigações gerais para com a sociedade permitindo a instabilidade nas relações no campo que redundam em violências de parte a parte, ao arrepio das leis vigentes.
O mesmo pode-se afirmar em relação à CUT, que se declara abertamente petista. Num cenário de desemprego galopante, não se registrou nenhum protesto contra o governo, mas sim, ameaças de greve e lutas mais acirradas se acaso a presidente for afastada, mesmo que consoante a Constituição do país.
Tais flagrantes e confessados aparelhamentos destes movimentos e sindicatos representam a antidemocracia de coletivos sociais que subservem o governo como se este não fosse transitório. Assim como as instituições do patronato jamais se confessaram psdebistas, sindicatos e movimentos sociais não poderiam virar subsidiários de um partido, pois a luta por direitos determinados deve se dar dentro do campo democrático, esteja este ou aquele partido no poder.

Desta forma, ao financiar com o dinheiro público instituições declaradamente partidárias, o governo pratica uma burla à democracia, qual seja, usar as verbas públicas (de todos) em seu proveito único, como se partindo do princípio absurdo de que toda a sociedade é petista e que no PT votará até a consumação dos tempos. Mais autoritário que isso, apenas cuspir na cara de quem discorda.

quinta-feira, 21 de abril de 2016

Ideologia e oportunismo

Há uma necessidade urgente de fazermos uma análise dos ditos tempos de chumbo e uma releitura daquela geração insurgente (da qual fiz parte) com a finalidade de se levantar alguns véus sob os quais se aninham mentiras históricas que se consolidam a cada dia, como verdadeiros abusos da história.
Era um tempo em que as mudanças estruturais eram possíveis, pois a hegemonia mundial não estava definida como observamos na atualidade. Duas grandes correntes ideológicas se contrapunham, se digladiavam seja de forma cruenta seja predominantemente nos incruentos embates de visões diferenciadas e antagônicas de mundo.
O que movia as esquerdas, principalmente os jovens incendiários era um sonho de justiça, um insaciável desejo de mitigar as dores dos mais desvalidos, através do protagonismo do trabalho e o rebaixamento (extinção) do capital, sua lógica desumana e predatória. Marx, decerto, foi um pensador poderoso, mas Jesus Cristo também o foi e nem por isso o mundo se converteu, na prática, aos seus ensinamentos.
Observamos que poucos líderes de esquerda espalhados pelo mundo levaram suas vidas pessoais coerentes com o ideal que professavam, pois fraquejaram diante do apelo às delícias matérias da vida burguesa. Um projeto de mundo que preconizava a busca de igualdade de vida material para todos estaria fadado ao fracasso, se os seus líderes comungassem uma vida cercada de confortos, futilidades e consumo conspícuo. Esta contradição foi o fardo pesado a corroer a consciência revolucionária e a seduzir corações e mentes de lideranças autoritárias e exigentes para com o coletivo, e indolentes e frouxas com elas mesmas.
Acredito que o PT, por circunstâncias históricas, foi o estuário final destas lideranças inorgânicas, cooptadas facilmente pela sedução de uma vida de fausto e consumo que fingiam combater, ou combatiam enquanto um discurso insincero, posto que era o único que herdaram em sentido utilitário. O corolário deste cenário profundamente vergonhoso é reconhecer que se apegaram aos seus currículos passados, já superados e anacrônicos, da pior forma possível, pois que os transformaram em propriedade privada, sendo que esta, em última instância, era o dragão da maldade que diziam combater.

No Brasil, foram poucos os homens que realmente se propuseram a mudar a vida do povo, que empreenderam suas lutas e se mantiveram, a nível pessoal, fiéis e coerentes com os seus ideais. Poucos foram os forjados no aço necessário que os movesse a pagar preço, a enfrentar os sacrifícios naturais e necessários, numa existência espartana, como exige toda liderança carismática que não é nem nunca poderá ser produzida por marqueteiros espertos e suas mágicas vazias. Hoje, estes guerreiros, involucrados em seus sonhos estiolados, repousam em seus túmulos (os vivos e os mortos) de frustrações, mas por verdadeiros, resguardam um recato necessário para a manutenção das suas dignidades e o conforto de terem combatido o bom combate. Nunca se fizeram credores, não mercadejaram seus passados, na busca de recompensas de ouro ou mirra. Em suas trajetórias hieráticas, não se traíram, não enganaram os oprimidos que sempre foram as chamas que os moveram de encontro aos horrores e aos inesperados que a vida preserva aos puros de sentimentos.

quarta-feira, 20 de abril de 2016

O PT, o poder e a sedução do abismo

Fico impressionado, matutando como o PT chegou a ser um partido dessa dimensão, acolhendo tantas nulidades cerebrais, quando não descerebrados. Apesar de ter conseguido aparelhar o Estado (usando a única estratégia que conhece: apelegando movimentos sociais, apadrinhando o funcionalismo público e remunerando a militância), é um partido de imensa fragilidade intelectual que demonstra não ter argúcia quando submetido a tensões políticas.
Decerto que escolher um poste/nulidade para colocar na presidência poderia parecer uma genialidade, mas que se transformou numa tragédia. Dilma surtou, viajando na própria irrealidade do mundo que concebe e pelas frestas do seu ensandecimento, a justiça, a sociedade e a comunidade política (nessa ordem) adentrou nas suas mazelas como boiada estourada desembesta trovejando no oco do mundo. Um projeto projetado para mil anos se esboroou num verão de poucos meses, mais em função dos seus erros do que pela força dos seus adversários.
Como é que um juiz de primeira instância consegue desnortear e reduzir a pó a credibilidade de um partido (que ganhou quatro eleições sucessivas), apenas cumprindo as leis vigentes no país? Decerto que a sua força não lhe pertence naturalmente, mas lhe foi concedida pela exorbitância de crimes cometidos por sucessivos governos em proveito do PT. A miragem de encantamento de uma impunidade sem limites e a ilusão do exercício de um poder sem freios se transformaram no pior pesadelo da cúpula do Partido dos Trabalhadores que tem num único personagem a tradução da sua voz e do seu rumo.
Hoje, o rumo que se descortina para as lideranças do PT é o da cadeia e o único fio de esperança, a manutenção de Dilma na presidência, se esgarça com a celeridade das urgências nervosas.
Quando se espera que tal cenário de terra arrasada imponha uma natural prudência nas suas hostes debilitadas e desmoralizadas, eis que o seu mandachuva estabelece um plano mirabolante e improvável de antecipar eleições e vencê-las e com isso calar a sociedade, submeter as instituições e amordaçar as consciências. Improvável antecipação, improvável eleição e impossível soerguimento político-moral para sequer administrar um condomínio de subúrbio que tem ao lado um puteiro decadente. Nesse surto de Alice persevera na toada de sobrepor erros e mais erros sem se dar conta de que estes aprofundam os problemas do país, punem o povo e acirram ódios incontroláveis. Tais ódios são cevados tanto entre os adversários quanto nas próprias fileiras, em função de tantas traições e abandonos. José Dirceu preferiu a cadeia à infâmia de confessar-se um crápula, mas não podemos esperar que a Dilma traída mantenha a mesma postura contida, mesmo porquê, apesar de cúmplice, não é natural e benquista no ninho petista.

O projeto mais imediato do PT se resume no desespero de evitar ou adiar a prisão de um único homem, o Lula. Tal fato nos dá a medida exata do tamanho de um partido que se imaginava tão sólido e poderoso. Tal ambição se equivale à de muitos delinquentes rastaqueras espalhados por todo o país: fugir da cadeia. Ocorre que tal negação da realidade dá rédeas soltas para uma produção massiva de despautérios que em seus deslimites flagrantes estão, por fim, afastando os aliados periféricos, aos quais não se poderá legalmente apontar conivência ou participação direta nos tantos desmandos para com a coisa pública. Alucinações como esta de a Dilma discursar na ONU sobre um inexistente golpe institucional contra o seu mandato, espanta todos aqueles que não utilizaram a beberagem do pó de ptpirlim. Com isso, naturalmente, mesmo autoridades carreiristas que lhe devem cargos de importância no Estado, descobrem que é dada a hora de abandonar o navio, pois a travessia se torna inviável posto que o capitão imagina-se imperador romano e a imediata enlouqueceu e, após trancafiar a tripulação mais ralé nos porões, anda pelo convés ateando fogo nas dependências de lazer destinadas aos passageiros mais aquinhoados.

quarta-feira, 6 de abril de 2016

O STF acovardado, corrompido ou desnorteado?

Apesar de ser um projeto de extrema perversidade e egoísmo, dá para tecer uma explicação lógica para a atuação temerária dos petistas, principalmente Lula e Dilma. É razoável acreditar que ambos buscam um confronto que possa resultar numa ruptura institucional, uma vez que esta é a única estratégia que vislumbram lhes permitir camuflar crimes comuns em punições políticas, vítimas de perseguições ideológicas.
De forma contrária não consigo dar um entendimento lógico à atuação extremamente afoita e deletéria para as instituições, ao procedimento do ministro Marco Aurélio, do STF. Não o vejo acossado ou desesperado, fugindo de algo avassalador que o conduza a produzir tamanha estupidez jurídica, uma vez que contradiz a lógica posta e cria um impasse entre o Legislativo e o Judiciário. Conceder uma liminar OBRIGANDO o presidente da Câmara a constituir uma Comissão para avaliar um pedido de impeachment do vice-presidente, Michel Temer. Assentado em robusta jurisprudência (reiteradamente decidido pelo STF e inscrito na Constituição) que afirma ser o presidente da Câmara o único com poder de decidir o encaminhamento (ou não) para constituição de Comissão de Impeachment, não poderia, sob pena de desídia, um ministro do Supremo se arrogar um poder que não lhe pertence com a agravante de ser este direito de outro poder que não o Judiciário. Desta forma, segundo a liminar insana, o ministro do STF, num golpe de caneta, usurpa o poder do presidente da Câmara, decide por ele. Pode-se, ainda, acrescentar ao desarrazoado de uma decisão que subverte a lei e a lógica formal. Em verdade, a liminar do ministro Marco Aurélio é calamitosa na medida em que gera total descontrole sobre o ritual de admissão do impeachment em toda a cadeia que o requer. Em resumo, TODAS as representações de impeachment devem ser admitidas fato este que se traduz numa obtusidade estúpida. A rigor, amanhã um pedido de impeachment contra o próprio ministro Marco Aurélio, não poderia ser arquivada pelo presidente do Senado, pois uma liminar impetrada, segundo esta jurisprudência, teria necessariamente que impor ao Senado a formação de uma Comissão para avaliar e julgar a continuidade ou não do processo.
Independente de todas estas considerações sobre legalidade e lógica, o que mais me estarrece é atinar sobre qual motivação moveu o ministro a cometer tão tresloucado gesto. Certamente ele não está, no momento, na defensiva, ainda não está com a polícia no seu encalço. Qual o interesse do ministro em contribuir substancialmente para um confronto que está sendo provocado, de forma escancara, pelos governantes (inclusive Lula, no poder “informalmente”)? Decerto a conclusão de que é movido por gratidão à Dilma, por ter ungido sua filha a uma desembargadoria que não merece (por falta de méritos), não nos parece satisfatória. Talvez o ministro, enquanto cidadão, acredite que a melhor solução para a atual conjuntura seja a convocação de eleições gerais, mas isto não é sua função enquanto ministro do STF. Como última opção, existe a possibilidade, de o ministro ter sido subornado pelo governo, fato que não espantaria mais ninguém, dadas as soberbas demonstrações de prevaricação explícitas e a existência de uma reedição do mensalão a céu aberto gozando da mais completa impunidade.
De toda sorte, no panorama atual, não mais há aquelas garantias, tradicionais e pétreas, que garantiam impunidade a atos desta natureza e acreditamos que mais dia menos dia, o ministro se verá na obrigação constrangedora de responder diante da Justiça pelos seus atos. A diferença é que nesta hora, ele estará sem a camuflagem da toga, sem a solidariedade dos honrados e fugindo da cadeia, literalmente.

Tudo isso pode acontecer se a medida da justiça passe a ser não a importância dos cargos ou o tamanho do poder, mas sim a profundidade dos crimes cometidos. Por isso tenho repetido que a força do Moro não vem do seu cargo, mas dos tantos crimes cometidos, ou seja, a fragilidade da Dilma e do Lula está na delinquência desabrida com que andam perpetrando cumulativamente e não na força de um juiz de primeira instância que apenas cumpre a sua função com diligência, competência, inteligência e muita sagacidade para lidar com tantos patifes de inesgotáveis poderes e influências indevidas.

sábado, 2 de abril de 2016

É golpe? Não! É mais um crime!

O bordão (é golpe!) sabidamente desprovido de qualquer fundamento, foi criado pelos petistas e disseminado país afora. Enquanto palavra de ordem, para usufruto nos embates políticos, é manipulada como argumento (embora desarrazoado) que se pode contestar, mas não reputar como um crime. O mesmo não se pode afirmar quando autoridades da República fazem oficialmente esta afirmação, pois que existem limites legais a serrem observados.
O chefe do Executivo não pode se sobrepor ou se imiscuir nos restantes poderes (Legislativo e Judiciário) sob pena de incidir em crimes contra a Constituição e contra o estado de direito.
A Constituição em vigor estabelece normas claras sobre as condições do já (barrosamente canhestro) pelo STF. Regra posta compete a TODOS a sua irrestrita obediência. Ocorre que o estabelecido é que o presidente da Câmara tem o poder monocrático de aceitar ou não os pedidos de impeachment contra chefe do Executivo e, em nenhum momento a Lei estabelece critérios que este presidente da Câmara tenha ou não respaldo moral para tomar tão decisão. Portanto, segundo a Constituição, o Eduardo Cunha tem o poder legal de aceitar o pedido de impeachment, e assim o fez. Autoridades públicas não podem afirmar irresponsável e impunemente que cumprir a lei é golpe.
A Constituição em vigor estabelece que o pedido de impeachment será avaliado por uma Comissão que decidirá ou não se existem motivos para a continuidade do processo. Desta forma, só ela tem LEGITIMIDADE para prolatar tal decisão. Não pode, desta forma e sob a insubmissão às leis, a presidente da República, de forma reiterada afirmar em sucessivos pronunciamentos públicos que se trata de golpe, que não cometeu crimes de responsabilidade. Tais afirmações devem constar tão somente na defesa a que teve pleno direito. Tal procedimento é uma intromissão e usurpação das prerrogativas do poder Legislativo, nesta fase, da Comissão de Impeachment, que é a ÚNICA legalmente habilitada a fazer tal avaliação. Caso seja aprovado o processo de impeachment por esta Comissão, a lei determina que tal decisão seja submetida ao plenário da Câmara que, por votação, tomará uma decisão. Desta forma, não cabe ao Executivo trombetear que se trata de golpe ou que crimes de responsabilidade não foram cometidos. Não há como agasalhar a irresignação sobre uma decisão prolatada consoante as leis vigentes, pois estaríamos adentrando num cipoal interminável de inseguranças jurídicas.
Suponhamos que o Dr. Rodrigo Janot, o nosso PGR (mas que para o Lula é apenas um merda), denuncie a presidente Dilma ao STF (que para o Lula é uma confraria de acovardados), em função de possíveis crimes observados nas gravações que garantiam ao Lula um habeas corpus preventivo (oriundo do Executivo?). Poderia a presidente, sob pena de afrontar o Judiciário e as leis, montar palanques diários afirmando que a representação do PGR nada mais é que golpe? Suponhamos que o STF aceitasse a denúncia. Poderia a nossa presidente, na sua condição de chefe do poder Executivo, questionar oficialmente tal decisão do supremo afirmando que é golpe e que não cometeu os tais crimes apontados? O julgamento se houve ou não crimes é exclusividade (no caso em tela) do STF e a lei não condiciona se está acovardado ou não. Existem os meios legais para tais arguições de defesa, mas seguramente o procedimento da presidente não estará dentro da lei e o que fere a lei é crime. O mesmo vem ocorrendo com o julgamento de impeachment e tais fatos indicam que as suas atitudes destemperadas e ilegais já ensejam um novo pedido de... impeachment.
Dessa forma, o que a realidade tem mostrado é que as atitudes oriundas da presidência da república criam um círculo vicioso de sobrepor o cometimento de crimes evidentes aos possíveis crimes que ainda nem foram julgados.

É como se um réu, no transcorrer do seu julgamento, fosse assassinado as testemunhas de acusação, à luz do dia e com testemunhas, e isso não tivesse importância, pois prevaleceria o julgamento original ainda não transitado em julgado.

sexta-feira, 1 de abril de 2016

Além do razoável

Vivemos tempos ensandecidos, onde pululam pensamentos e discursos nada razoáveis. Convencer uma população bestializada, analfabeta e sem cidadania de que algumas mentiras representam a verdade verdadeira é tarefa de fácil elaboração e execução, principalmente quando se tem à disposição poderes e verbas quase que inesgotáveis. Convencer a maioria do povo de que Lula é um cidadão de vida despojada, um brasileiro comum ou que os governos do PT priorizaram os mais pobres não requer maiores malabarismos de criatividade mesmo para marqueteiros medíocres e de pouco talento estético-cultural. Mesmo porque o marketing, grosso modo, é a antítese da arte, a negação da criatividade verdadeiramente libertadora, pois que tem por finalidade o engodo que objetiva o aprisionar as suas vítimas.
Sinceramente eu entendo as ações (mesmo as injustificadas moralmente) dos chamados mortadelas, um bando de manipulados através de cargos no governo ou simplesmente das migalhas distribuídas nas manifestações públicas, tipo um desarrazoado e patético “não vai ter golpe”. Pelo avesso, também com sinceridade, não consigo entender (muito menos justificar) a postura de pessoas que têm discernimento de sobra para olhar a realidade e ver que está exercitando o cinismo cívico ao fingirem enxergar uma realidade que não existe, que nem dúbia é.
Pego como exemplo, não por acaso, mas pelo grau de exposição nessa lide tragicômica, a figura de Chico Buarque, dentre tantos outros que podem se assemelhar, para tecer algumas considerações de cunho analítico-prospectivo. A verdade é que o Chico é o maior compositor popular nascido neste país. Apesar de ter criado canções extremamente elaboradas e abordado temas de difícil curso, conseguiu seduzir o seu povo, com formação deficiente, de uma forma avassaladora e merecida. Talento, sensibilidade e bagagem cultural. Não há marketing que consiga transformar em sucesso uma letra que ousa usar a palavra escafandrista!
Acusações maldosas, resultantes de compreensível indignação, especulam que a sua solidariedade ao PT e ao Lula, existe em função de vantagens auferidas junto aos governos petistas. Filho de classe média alta ganhou dinheiro suficiente para levar uma velhice confortável e ainda goza de prestígio que lhe possibilita ganhar outro tanto. Heloísa tem todos os méritos para ser Ministra da Cultura no Brasil ou na França e se aqui o foi, são circunstâncias que desconheço e não tenho porque colocar em dúvida o processo que a conduziu a tal cargo. A Lei Rouanet é um balcão de atendimento caótico, no qual, como tudo no país, sempre tende a resolver as opções pelo lado mais fácil e óbvio: prioridade aos mais famosos, mesmo não necessitados.
Chico, por toda a sua vida adulta esteve exposto ao público e, apesar de manter discreta privacidade, foi alvo preferencial da mídia. Por todo este tempo nunca demonstrou nenhum desvio de caráter e sempre manteve uma postura sincera, mesmo descontentando alguns. Nunca se mostrou gratuito.
Diante do acima analisado, por razoável, não há como enquadrar Chico Buarque como um lobotizado mortadela ou um reles aproveitador das tetas de governo ou, ainda, um porralouca ideológico. Não faria sentido, já que estamos observando a realidade o mais aproximado do que ela é. Há que se observar e reconhecer que, ao longo da vida, ele foi, por várias vezes, tentado a aderir (existem formas discretas), em troca de enormes facilidades e não o fez.
Então, qual mistério, qual razão para nos depararmos com este artista singular defendendo publicamente um governo sabidamente corrupto e um líder a meio caminho da prisão por crimes de variados calibres? Os méritos pessoais do Chico são muitos, sempre foi exigente com suas obras, coerente com suas ideias e meticuloso no detectar e expor os maiores e menores erros de um regime antidemocrático por definição e autoritário por natureza. É neste ponto que a minha perplexidade se agudiza. Como este exímio especialista não farejaria a negociata rasteira, a esperteza covarde e a flagrante traição ideológica levada a cabo pelo Partido dos Trabalhadores? O que o leva a acreditar num golpe da direita contra um partido de esquerda no poder? Me estarrece acreditar que Chico Buarque crê (e acredito que assim o é) que o PT é um partido de esquerda realmente, nas suas práticas de governo. O PT ensaiou tais aleivosias antes de assumir o poder e logo em seguida mergulhou na amorfia partidária reinante, de direita, corrupta e insensível. Os fatos demonstram que em treze anos de exercício do poder, o PT nada mais fez do que dar continuidade à política neoliberal, acrescentando apenas um ostensivo aparelhamento do Estado. Em treze anos de poder jamais apresentou um projeto (nem de esquerda ou reformista que fosse) próprio para o país e viveu de ensaios erráticos e de improvisações nas quais predominavam objetivos eleitoreiros. Como agravante, aprofundou e sistematizou a corrupção institucionalizando o crime enquanto política de Estado.
Sabemos que a nossa elite não enxerga o povo do país senão enquanto massa de manobra, bois a caminho do matadouro. Assim continuou nos governos do PT e as ações sociais não mantinham preocupações socais, mas sim com o aumento do cacife eleitoral traduzido em votos. As verbas usadas nestes programas sempre foram imensamente inferiores às destinadas aos banqueiros e aos “empreendedores” ricos e amigos.
Conheci muitos artistas e pretensos artistas que nada mais aspiravam da vida além de uma carreira de sucessos, o que implicava em muito dinheiro e vida mansa. Nunca foi o caso do Chico, que sempre demonstrou sincera preocupação com os rumos deste país e os que duvidam atentem para o fato de que a sua obra é um eterno e obsessivo recontar da vida do povo. Ele emprestou a sua fala aos silenciados (não só aos exilados políticos), aos excluídos e aos simples de coração.
Prefiro acreditar, com alguma razoabilidade, que ele foi tragado pelos seus desejos e estes lhe suplantaram a racionalidade. Creio que ele observa o PT ainda como aquele partido combativo, heroico, intransigente em eterna pugna por justiça social. Nega-se a acreditar que a última oportunidade estiolou-se diante das opções burguesas de líderes que prezavam mais o consumo conspícuo do que o cheiro do povo, que sempre exala suor e sangue, êxtase e agonia.

O horror maior pode estar por vir em breve, e os seus desejos frustrados se transformem em pesadelo, caso sejam comprovados os crimes hoje investigados. O nefando bafo da perversão de se saber instrumento que forneceu sobrevida a estas lideranças que a aproveitaram para obstar ou inibir a descoberta de crimes perpetrados contra o povo, usando exatamente a força que a cidadania confere aos seus mandatários. Para alguém honesto, não concebo panorama pior.