Meu caro petista da Liga
Anti-Fascista.
Não tenho por costume escrever
respostas a cartas apócrifas, principalmente guardando fundadas desconfianças
de que se trata de um texto encomendado e pago a peso de ouro e a venda da
consciência. Acreditei, a princípio, que o título do texto (O ódio das
trincheiras) deveria ser uma análise dos embates midiáticos suscitados pelas
inacreditáveis mazelas perpetradas pelos integrantes mais brevetados do Partido
dos Trabalhadores. Muitos destes crimes já foram apurados (alguns até
julgados), mas os indícios (robustos) apontam para coisas do arco da velha,
enredo nunca posto em prática no mundo civilizado (nem na barbárie). Argumentam
os petistas que tudo isso nada mais é que uma conspiração das elites para apear
a esquerda do poder. Por que as elites teriam tal interesse, se todas as suas
vantagens e seus privilégios foram mantidos (e aprofundados) nestes anos sob o
comando de Lula e Dilma? Quais condições práticas teria uma oposição para
inventar crimes e forjar tamanho manancial de provas, numa conjuntura em que o
governo tem condições privilegiadas de defesa e mesmo controle sobre as
investigações?
Acredito que quem despertou o
ódio irracional foram os petistas, ao tentarem, a todo custo, defender o
indefensável. Ao tentarem politizar questões de polícia e do judiciário, numa
insensata negação dos fatos, os petistas se colocaram numa postura de
seguidores religiosos fundamentalistas (outros por questões econômicas, a
célebre boquinha que sempre é oriunda do dinheiro público) e isto açulou os
aloprados fundamentalistas anti-PT, a direita raivosa e truculenta. Concordo
que aloprados temos de todos os matizes, mas os com maior poder de malfeitar,
são os que estão no poder. O supra-sumo da intolerância antidemocrática dos
petistas fica patente na medida em que tentam impor os dirigentes petistas (simples
mortais) como portadores de valores universais. Acusar Lula é atacar a
democracia, pedir o afastamento de Dilma é ser antidemocrático, investigar
indícios de crimes se transforma em conspiração de direita.
Concordo com você que é estupidez
afirmar que o PT é comunista, seus quadros não têm envergadura para tanto, pois
deve ter meia dúzia de comunistas em suas fileiras (os verdadeiros caíram fora
na primeira leva, nas primeiras esparrelas do Lula na presidência). Lembro que
nas discussões de apoio ao Lula no segundo turno, contra o Collor, lá em
Cajamar (isto está publicado em livro), o velho Prestes afirmou que Lula não
era nem nunca seria comunista, e apontou a principal razão, era preguiçoso e
não queria estudar para entender o mundo.
Creio que você mesmo concorda com
isso, pois reconhece que vivemos 13 anos de governos petistas “onde os
banqueiros obtém recordes em seus lucros” (palavras
suas). Então, não sendo comunista nem querendo assumir posturas de direita
(apesar de manter e aprofundar a política neoliberal de FHC) o que restou ao PT
em sua sanha de manter o poder? Eu, particularmente, acredito que a aposta
política petista foi jogar todas as suas fichas num governo midiático e tal
opção afastou seus dirigentes da realidade do povo deste país e mesmo da
realidade cotidiana. Perambulam feito Alices, pois que o fã-clube perdeu os
atrativos e os seguidores e simpatizantes já não salivam automaticamente. Isso
acontece com muito artista famoso, porém sem conteúdo. A irresponsabilidade é
patente, pois o mundo glamuroso dos olimpianos não se confronta com a miséria e
o sofrimento dos esfomeados, mas os governos não são eleitos para escrever
roteiros de fantasias. Acredito que estes governos petistas gastaram mais com
propaganda do que com o bolsa-família, pois para eles era mais importante
propagandear o feito (votos) do que a própria realização: amenizar a miséria
dos mais necessitados. Acredito que deu mais dinheiro para os ricos do que para
o bolsa-família e acredito que o montante de valores escoados pelos esgotos da
corrupção foi maior que o empenhado no bolsa-família. Este seu próprio (?)
texto desmascara a forma enrustida (uma espécie de venda casada) onde combate a
extrema direita e as cassandras dos quartéis num contexto de defesa de Lula,
Dilma, et caterva.
Perseverar espancando os fatos,
reafirmando que Delúbios, Dirceus, Genuinos e Vaccaris, condenados e presos
democraticamente, são heróis do povo, é mais fundamentalista e antidemocrático
do que a atitude da direita aloprada que clama pelos militares. Absolver réus
condenados na marra não está na nossa Constituição, porém a intervenção militar
está.
Aos dezoito anos eu estava preso
nos porões do DOPS, em Belo Horizonte, e por lá fiquei oito meses. Nunca tirei
proveito disso. Não acredito numa solução militar e eles não têm um projeto
para o país. O projeto de país elaborado nas casernas foi posto em prática, se
esgotou e caiu de podre. Ninguém derrubou a ditadura, pois ela caiu de podre,
mas antes negociou (como sempre) um acordo pelo alto, longe do povo (solução
confiável de Tancredo Neves). Em treze anos no poder o PT teve oportunidades e
condições objetivas de mudar uma estrutura perversa que tem como corolário o
privilégio e a impunidade e não o fez, ao contrário, assumiu tal estrutura,
aprofundando-a nos descaminhos da imoralidade hipócrita, desde que causa
eficiente para os seus interesses. Nunca, em toda a história da República, um
governo deixou tão patente que administra os seus interesses em detrimento dos
interesses da sociedade. O que a Dilma tem feito, de forma escancarada, para se
manter no poder, nem o Collor ousou em seus momentos mais extremos de delírio e
arrogância.
Existem várias maneiras de
combater a intolerância, a opressão e a estupidez. Mas não acredito numa que
fala em defesa da democracia imbricada na defesa de cidadãos que estão sendo
investigados, julgados e mesmo condenados pela justiça. Este seu texto não é
uma defesa da democracia e nem mesmo do PT, mas antes a defesa dos principais
mandatários de um partido, cuja maioria (os não detentores de foros
privilegiados) foi condenada (democraticamente) e muitos estão atrás das grades.
Enfim, tenha absoluta certeza de
que se o Lula for parar na cadeia, não terá sido pelo bom ou mau governo, por
ter sido bonzinho ou mauzinho para com os pobres ou ricos, mas simplesmente
porque usou os seus poderes (que são do povo) para tirar vantagens pessoais,
cometeu ilícitos penais, delinquiu.
Neste particular, contrariamente
ao que pensam os especialistas, a minha convicção, diante dos fatos, é que o
Lula será condenado não só por provas contundentes, mas, e principalmente, pela
ousadia de roubar de ricos. Ultrapassou os limites sagrados das regras
capitalistas. Ao enfiar os dentes agudos da corrupção na Petrobras, os
quadrilheiros do estado esqueceram de avaliar a reação dos particulares
lesados. No Brasil, roubar verbas da educação, da saúde e dos aposentados é
tarefa de facílimo cometimento, pois que dinheiro público, portanto, sem dono,
terreno baldio de fácil acesso, livre manipulação e garantida de impunidade.
Muito diferente é ter a ousadia de roubar fundos dos EUA, da Noruega e da
Inglaterra. Desviar recursos do INSS pode, roubar do Bradesco e do Itau é
aventura fadada a dar com os burros n´água.
Não se engane, persevere lutando
pela liberdade e pelas causas que são justas, mas deixe as defesas judiciárias
aos competentes e caros advogados, como prescreve as regras da democracia.