sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

LONGO TEMPO DE DESMESURAS

A sucessão de escândalos que ocorrem neste ano de 2015, parece que nada mais é do que a continuidade de tantos outros que antecederam e de novos que decerto sucederão. Não comungo desta ideia, pois acredito que as ocorrências atuais atingiram o que os gregos chamavam de desmesura e, sob outra perspectiva, encaminham o país para o que Durkheim conceituou de anomia.
Assim como o rompimento da barragem, em Mariana, inundou o meio ambiente com rejeitos que provocarão danos incalculáveis ao longo do tempo, a atuação das elites está sufocando a sociedade como um todo com o fedor corrosivo do desrespeito mínimo à cidadania e as regras primárias recomendadas à civilidade. Desta forma, a barragem ética se rompeu de forma insanável e inundou a sociedade com ações e intenções manifestamente criminosas que resultarão em consequências irreparáveis (também ao longo do tempo) que ainda não podem ser devidamente equacionadas.
Esses danos à sociedade brasileira se apresentam em dois planos distintos: o material e o espiritual.
É inegável que, na atualidade, vivemos tempos em que as ações dos homens públicos (todos aqueles que de alguma forma detêm o poder público, do presidente a um simples oficial de justiça) atuam de forma desembaraçada, deixando patentes seus crimes contra a cidadania de forma mais clara que fratura exposta. Tal exposição pública de sucessivos desmandos tem sérias consequências danosas à sociedade em geral, pois que redundam em dificuldades materiais aguçadas (inflação, desemprego, recessão, etc.) e revoluteiam no cevar de um sentimento de baixa estima cominado com uma revolta latente, não direcionada, que redunda em violência represada que eclode de inopinado, na maioria das vezes sem ligação com o fato gerador.
Provas nos trazem as certezas e os indícios nos encaminham para a desconfiança. No que tange ao cometimento de crimes contra a nação, o Brasil de 2015 transformou-se num campo fértil em provas sólidas que estão conduzindo figuras olimpianas à cadeia. É alentador o fato de que personagens poderosas (político-econômico) hoje se encontram encarceradas, cumprindo-se, pela primeira vez na nossa história, de forma (quase) consistente, o axioma basilar de que a justiça é feita para (quase) todos. Tal fato me leva à conclusão de que vivemos um momento único, uma quadra crítica, na qual estão sendo decididos os rumos do país na questão dos costumes. Decide-se agora se seremos um país que respeita a cidadania ou se vai enveredar cada vez mais enredado, num aprofundamento de um patrimonialismo caduco e sem espaço no concerto das nações.
As provas destes crimes contra o povo resultam em processos que serão julgados por tribunais (com ou sem foro privilegiado) e resta-nos a esperança (deveríamos ter certeza!) de que sejam julgamentos honestos, que os juízes e desembargadores agirão consoante a legalidade.
A minha dúvida acima se justifica quando adentro na questão dos indícios, os tais que geram desconfianças justificadas. O panorama que observamos (impotentes cidadãos) é de terra arrasada, digno de sentar no meio-fio das nossas desesperanças e chorar até que a catarse nos mate, seja por impotência, nojo ou tristeza. Assim como a desconfiança de um policial surge através de indícios, o mesmo ocorre com a sociedade, acontece comigo. Desta forma passo a expor o meu (sacrossanto, pois que lógico e justificado) leque de desconfianças sobre os homens públicos do meu país.
A confiança é fator fundamental para o crescimento econômico, mas é principalmente a alavanca para a autoestima individual e social. Como podemos construir uma sociedade produtiva e feliz (justa) se ancorados à desconfianças generalizadas?
Segundo indícios, desconfio de que fiscais em geral, policiais e policiais rodoviários recebem propina para aliviar transgressões que podem resultar em multas.
Segundo indícios, desconfio de que membros dos Tribunais de Contas (União, Estados e Municípios) e do CARF negociam sentenças.
Segundo indícios, desconfio de que juízes e desembargadores negociam sentenças.
Segundo indícios, desconfio de que o Rodrigo Janot (Procurador Geral da República) atende precipuamente os interesses do governo e não da República brasileira.
Segundo indícios, desconfio de que o STF atua precipuamente no sentido de defender os interesses do governo e não na defesa das leis e da Constituição.
Segundo indícios, desconfio de que existem desvios de conduta em todos os segmentos do poder público no Brasil.
Não há como negar que existem robustos indícios de que o Partido dos Trabalhadores, após anos de desempenho baseado num discurso de ética na política, após a sua chegada ao poder, transformou-se num organismo que aparelhou o Estado e montou um esquema de corrupção institucional, aprofundando o patrimonialismo de forma abissal, objetivando privilégios partidários e individuais. Talvez acreditando na miríade de um Reich de dois mil anos e convicto de que eleições são vencidas com dinheiro, foram ao lugar aonde se concentra o maior montante dele no país, os cofres públicos e os negócios públicos. Trata-se do lugar economicamente privilegiado, a Pasárgada dos mega negócios. Ocorre que a montagem de tal megaestrutura demanda exercício logístico de impressionante e difícil montagem, só é factível com a participação efetiva de toda a estrutura de poder, agindo em consonância com os seus objetivos criminosos. E os indícios de tal arquitetura escorrem pelas notícias e documentos com mais fartura que a lama que transbordou Mariana e se espraiou por todo um imenso ecossistema. Diante disso e estribado em diversos indícios, ninguém pode me tirar o direito de desconfiar que o alto escalão do governo participou, de forma consciente e ativa, desta empreitada, inclusive o ex-presidente e a atual presidente. O fato de os ex-tesoureiros do PT estarem na cadeia, é um indício que me leva a desconfiar da lisura e legitimidade das eleições (não só as majoritárias). Fatos noticiados pela grande imprensa me levam a desconfiar de uma série infindável de coisas, tais como: juízes, desembargadores e do próprio Supremo Tribunal Federal. Da mesma forma, me dão o direito de desconfiar que os sorteios das loterias da Caixa Econômica são fraudados (imagine uma fraude direta contra o povo!). Histórias mal contadas, enredos sem sentido, me levam à desconfiança de que o Bumlai e os filhos do ex-presidente, Luiz Inácio da Silva, obtiveram vantagens privadas através da coisa pública. Sabemos que na Petrobras existe um sistema rigoroso de controle que dificulta o simples roubo de um parafuso e a consecução do negócio com a refinaria de Pasadena me faz desconfiar que seria inviável sem a atuação da presidência da estatal e do seu conselho. No limite (segundo indícios) desconfio que o presidente da república, Luiz Inácio da Silva, tinha conhecimento e mesmo aprovou. Compulsando o noticiário percebe-se que era um negócio tão grotesco (pelo absurdo de sua lógica) que não seria possível a alegação de desconhecimento de informações, pois tais decisões passam por um sistema de controle minucioso (notadamente do setor jurídico que é fabuloso!). Indícios sobre os pagamentos das palestras do ex-presidente e a movimentação fabulosa nas contas bancárias de Palocci, Pimentel e Erenice me fazem desconfiar de lavagem de (muito) dinheiro.
Não obstante explicações de cunho técnico-jurídico, a sociedade que não tem dúvidas de que o senador Delcídio do Amaral cometeu crimes graves e não vai entender como o seu julgamento pode demorar 10 ou 20 anos ou mesmo prescrever. Mais desconfianças...
O mensalão desnudou o embrião do Petrolão, mas as provas produzidas naquela negociata deixaram clareza na compra pura e simples de apoio político, por parte do governo. Isso se traduz na burla da vontade popular através do seu sagrado direito de voto (que hoje a Dilma Roussef desfralda como valor universal, em defesa do seu mandato). Recentes reformas ministeriais deixam pegadas de indícios (e mesmo confissões) de que ministérios e cargos importantes são entregues não à competência, mas condicionados a determinada quantidade de votos no Congresso Nacional. Isso me concede o direito de desconfiar de que o governo e o seu partido usam o Estado para seus interesses particulares e não para a sociedade.
Diante deste panorama de terra arrasada, contrarrestando tantas mazelas, temos a figura emblemática do Juiz Sérgio Moro, do qual não tenho nenhum indício que me proporcione desconfianças. Acredito (necessito acreditar!) que existem outros Moros (em outros setores da vida pública) que ficam acima das suspeitas, pois que traçaram para as suas vidas metas baseadas em firmeza de caráter e pactuam sentimentos de que a existência humana necessita ser justa para que tenha dignidade. Ainda, conforme os indício, guardo a desconfiança de que este exército de Moros, apesar dos méritos, é um Brancaleone revisitado, que pode ser constrangido e inviabilizado pelos cínicos sabujos do poder, de forma imoral, porém legal.
Acredito que estas minhas desconfianças (e inúmeras outras) não são descabidas, assim como creio que são compartilhadas pela maioria da população brasileira e que isto desperta sentimentos coletivos de revolta, vergonha e impotência. O somatório de tal herança negativa não nos propicia esperanças de uma vida melhor ou minimamente ffeliz.

Não trato aqui de questões político-partidários e muito menos as de cunho ideológico, mesmo porque os indícios coletados nas diversas mídias me dão conta de uma distorção (proposital) que está apartando a sociedade em grupos de contra e a favor, mas que tais posicionamentos não debatem ideias e fatos, apenas vociferam suas palavras de ordem. Acredito que tal posicionamento é admissível (não benfazejo) em torcidas de clubes de futebol, mas uma ideia totalmente distorcida quando se trata do país e do seu futuro.

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