sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

PREFÁCIO ANDEJARES (FRAGMENTOS)

Anos depois recebi uma primeira edição de Sol Rente, um portentoso romance que enfoca a existência centenária de Pedro Isgorogota e mapeia um desfocado sertão, posto que observado de uma perspectiva interna, pessoal e, entretanto, contraditoriamente universal. No passar dos anos vou recebendo, um a um, os livros dessa assombrosa caminhada sem fim, pois que circular e infinita. Ao pé do fogo, Todas as sedes, Mandiocara, Desalmo, Todos os medos, ABC das infâncias... Eis que agora, por fim, pondo um ponto final, recebo dois livros digitais: Movimentos e Andejares. Para este, solicita um prefácio e sobre aquele nenhuma palavra. Lacônico ao apresentar uma versão definitiva do seu primeiro livro, todo revisto e com mais do dobro de páginas, inconsoante com aquele de 1977, quando da primeira edição.
Dessa forma intermitente e lacônica fui recebendo todos os volumes deste conjunto de obra. Estranhamente, nunca me enviou seus outros livros publicados. Não me descortinou as coxias do seu teatro, nem o canto áspero de sua música ou as rimas dos seus poemas que enfeixam palavras precisas, como se recortassem com navalhas esta realidade construída sob os pilares da injustiça e da hipocrisia. Não viajei nos imaginados dos seus contos e novelas e demais escritos. Não me ensinou o poder da sua medicina, posto que viajante em variados conhecimentos, mestre engenheiro e doutor em humanidades. Sei apenas notícias vagas, penumbrosas, desta literatura que apesar de mesma se faz outra.
Que enigma guarda tal história de carochinhas? Qual o tamanho de uma teimosia que persiste e subsiste, recatada e silenciosa, por toda uma vida?
A realidade de consumo instantâneo me conduz a colher indícios/certezas de que poucos tomarão conhecimento dessa obra e que menor ainda será o seu número de leitores. Talvez eu e mais meia dúzia, talvez nem isso... Presumo que ele, como autor e pessoa arguta, deve ter avaliado esta realidade (melhor do que eu) e não guarda otimismos ou esperanças sobre o canto escuro que está reservado a esta sua obra de uma vida inteira. Então, por que perseverou indiferente às condições de rejeição e indiferença? Por que consumiu nervos e vísceras para semear uma flor, decerto natimorta, no deserto? Talvez seja a síndrome da flor do mandacaru que, lindíssima, desabrocha ao anoitecer e murcha com a claridade do dia. Poucos veem... Mas elas sempre estarão lá, amenizando a sequidão do agreste. Assim, creio que, qual flor que dura apenas um período noturno, Saga dos Perplexos, ficará eternizada numa miríade de renasceres, pois, é certo, que as noites chegam sempre após o pôr-do-sol.


FGR

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